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Leveza como Estratégia Neurobiológica para a Adaptação

Leveza como Estratégia Neurobiológica para a Adaptação

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Leveza como Estratégia Neurobiológica para a Adaptação

Recentemente, em uma conversa com Olivier Aizac, CEO da OLX, surgiu uma frase que resumiu um dilema recorrente nas organizações contemporâneas:

“O ambiente está pesado demais... e sem leveza e otimismo, as pessoas não aguentam, não se adaptam, não resistem.”

A observação, embora coloquial, carrega uma verdade profunda. Leveza não é um luxo, mas uma necessidade funcional em contextos de alta complexidade e instabilidade, como os que caracterizam o mundo do trabalho atual.

Frequentemente subestimada, a leveza é tratada como um atributo periférico ou culturalmente supérfluo. No entanto, uma análise das evidências científicas revela que estados emocionais positivos e ambientes psicologicamente seguros influenciam diretamente o desempenho cognitivo, a capacidade de aprendizagem e a colaboração entre indivíduos.

Em sua teoria "Broaden-and-Build" (Ampliar e Construir), Barbara Fredrickson demonstra que emoções positivas ampliam o campo de atenção, promovem maior flexibilidade cognitiva e favorecem o desenvolvimento de repertórios emocionais e sociais mais robustos. Em outras palavras, a positividade melhora o clima e modifica estruturalmente a forma como pensamos, percebemos e nos relacionamos com os desafios.

Essa expansão possui, inclusive, uma base neurofisiológica clara. Em estados de leveza, ludicidade e conexão emocional, é ativada a substância cinzenta periaquedutal (PAG), uma estrutura central do mesencéfalo envolvida na modulação da dor e no sistema de defesa comportamental. Estudos mostram que, quando ativada em contextos seguros, a PAG promove a liberação de encefalinas, opioides endógenos com propriedades analgésicas e moduladoras do estresse.

As encefalinas desempenham um papel fundamental na regulação descendente da dor, na inibição de respostas defensivas automáticas e na facilitação de estados mentais mais integrados, permitindo maior processamento de informações, maior resiliência emocional e, consequentemente, maior capacidade de adaptação diante da complexidade.

Por outro lado, ambientes organizacionais dominados pelo medo, vigilância e pressão constante ativam esse mesmo sistema neurobiológico em seu aspecto defensivo: respostas de congelamento, fuga ou agressão, com supressão da atividade do córtex pré-frontal e prejuízo das funções executivas. A capacidade de escuta, criação e colaboração é drasticamente reduzida.

Portanto, não se trata de defender a leveza como um “estilo de gestão” ou um “benefício emocional”, mas sim como uma condição neurobiológica para o surgimento da inteligência adaptativa coletiva. A leveza, nesse sentido, é uma tecnologia humana evolutiva, um estado que desarma os mecanismos de defesa e cria espaço para o pensamento sistêmico, a aprendizagem social e a inovação relacional.

O otimismo, da mesma forma, não é ingenuidade. Martin Seligman propõe o conceito de otimismo aprendido como uma disposição baseada em evidências: trata-se de escolher, diante da adversidade, a crença racional de que existem caminhos possíveis de superação e aprendizado. Essa disposição está diretamente correlacionada com mecanismos de resiliência.

Assim, leveza e otimismo não podem mais ser considerados meras “soft skills”. Eles constituem fundamentos neurocomportamentais e estratégicos para a sustentabilidade organizacional em contextos voláteis. Ambientes que favorecem estados de leveza e conexão emocional reduzem a carga defensiva do sistema nervoso, ampliam o repertório adaptativo e promovem respostas mais eficazes ao novo, ao incerto e ao complexo.

Construir ambientes organizacionais mais leves não é um ato de benevolência. É uma estratégia inteligente de regulação emocional coletiva, com sólidas bases na neurociência afetiva. Quando há leveza, há mais encefalinas, menos medo, e mais espaço, interno e coletivo, para navegar a complexidade com clareza, coragem e criatividade.

 

Benito Berretta
Benito Berretta

Managing Director of Hyper Island Americas, Speaker & Facilitator

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